Quando Deus criou o homem,Ele também criou a solidão. A solidão é do homem e de nenhum ser da criação a mais.Somos essencialmente egoístas quanto a isso. E disso não abrimos mão. Quando o primeiro homem se deu conta de que estava só, com seres que em nada entendiam a sua pouca voz. sem poder se comunicar,com a verborragia da animalia ao nascente, e o silêncio das bestas ao poente, ele então sentou e chorou.E essa foi o primeiro choro de um homem.
O homem durmiu.E durante a noite, forte dor o havia acometido.Sem sua permissão,sem o seu querer,seu corpo foi invadido.Ele que não havia pedido para existir,dividia-se em mais um ser.Dizem que a dor de fato não existiu,mas como medir a dor psicológica de uma ausência?Quando acordou,ele sabia,sem poder exprimir que algo de muito íntimo lhe havia sido retirado.Ao seu lado,na noite,estava durmindo a primeira virgem,e quando ela abriu os olhos,assustou-se com o que viu.Ele também,e com um gesto ao mesmo tempo,delicado e bruto a tocou...quando viu que era bom,a quis possuir como numa quarta-feira de cinzas.Ela se debatia,chorava,sentia o medo,o terror,por fim se rendeu.Assim nasceu o primeiro estupro.
Ela fugiu noite adentro,sem saber o que era, sangrando entre as pernas,na floresta selvagem e escura.Antes de fugir contudo deixará nele uma horrível cicatriz com suas unhas,quando ele acreditava tê-la subjugada.Ele gritara de ódio,a estapeará.Ele se armou,ia matá-la.Então ela correu,correu,numa clareira se escondeu,e sem ninguém ver..chorou,chorou.E toda vez que ouvia a voz daquele ser,com sua barba desgrenhada,suas vergonhas expostas,ela chorava mais e mais.Então ela se viu só.E só se tornou.Nos primeiros dias,aprendeu a viver com isso: a caçar,pescar...mas estava só.E mesmo com toda a dor,ainda pensava no primeiro ser que a tocou,no seu cheiro de almíscar,no gosto do sal,na língua que a invadia...sem se perceber ela se tocou,e sentiu tanto prazer,que desmaiada ficou.Queria encontrar de novo a sensação que não pode nomear.E resolveu o primeiro homem caçar.Nasceu o primeiro orgasmo,filha da dor.
Ela o encontrou.Estava armado,bruto ameaçador.Ela também.Não haveria como saber: Então se jogaram um no outro se engalfinharam,e nos movimentos de violência,o prazer surgiu de novo,dessa vez em conjunto.Ele havia e muito se tocado pensando em tudo aquilo,e de novo tudo lhe pertencia.Da violência,se fez gozo.Do gozo se fez orgasmo,do orgasmo se fez sentimento.E do primeiro estupro,se fez o primeiro amor.
Do amor se fez a novidade,da novidade o tédio,do tédio a conveniência.Não era preciso mais esforço o prazer estava a mão,o homem não precisava mais se preocupar,se apaixonar,sentir amor.Então o homem se tornou frio,ocupados com outras coisas,e nos fins de semana,quando Deus descansava,fazia suas necessidades carnais,a dispensava, e ela sozinha retornava a mesma solidão que antes,mas ela se viciara naquilo,na companhia,ela queria aquilo,não tinha a quem recorrer...se houvesse uma semelhante como ela,teria amado-a,mas ele era o diferente,aquele que por mais que se esforçasse não o compreendia. Da incompressão feminina se fez o primeiro machista.
E do primeiro machista se fez o primeiro canalha. Foi ai então que ela percebeu, o seu pecado orignal, e assim o que era paraíso se perdeu: O homem a fez dela amante,não mulher. Não a respeitava como igual,menos ainda que as bestas.O homem era volúvel,mesquinho,egoísta.O homem amava mas do carinho que viciava queria distância,a coincidência dos sentires era um instante de brilho de estrelas mortas. O homem era lobo do homem, e a mulher seria a serpente do homem.Então ela quis se afastar,se desfazer desse fardo,da humilhação. E assim ocorreu a expulsão do paraíso,a primeira separação.
Veio a dor,da dor veio o parto,do parto veio uma nova geração de frustrados,renegados,desesperados pelo amor original que se perdeu. Do primeiro Abel, tentou a fé até não ser escutado.Do outro Caim,de cíumes de um pai do qual não podia ver e ser compreendido,querendo um incestuoso amor do filho do primeiro homem,não o tendo em vida o consumou em morte.E assim,de novo,o homem é expulso de novo de seu lar.Da dor se fez o primeiro parto,dele se fez o cíume, e do cíume inventou-se a morte.
...E assim caminha a humanidade.